Autoridade marítima espera que propostas legislativas preservem distinção entre regulação técnica e regulação econômica
A Marinha do Brasil espera que os projetos de lei sobre a regulamentação da praticagem que tramitam no Congresso permitam que a autoridade marítima concentre esforços em suas prerrogativas de segurança da navegação, salvaguarda da vida humana e prevenção à poluição ambiental causada por embarcações e plataformas. Durante audiência pública na Câmara dos Deputados, na última quinta-feira (31), o diretor de portos e costas (DPC), Sérgio Renato Berna Salgueirinho, disse que a autoridade marítima defende a proposição de que a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) assuma o papel de regulador econômico, conforme sugerem os projetos de lei 4.392/2020, do deputado Alceu Moreira (MDB-RS) e PL 757/2022, editado pelo governo federal na gestão passada.
A Marinha vislumbra que o arranjo proposto pelos dois PLs consolida a percepção de competências distintas para regulação técnica, hoje exercida pela autoridade marítima, e econômica, a qual considera inexistente no país. “A regulação econômica não é realizada pela Marinha. Em virtude de imperfeições causadas pela existência da escala de rodízio única, por razões essencialmente técnicas, há imprescindível necessidade de regulação econômica. A Marinha não possui vocação para regulação econômica e considera que a separação entre os entes — regulação técnica e regulação econômica — deve ser preservada”, pontuou Salgueirinho na sessão realizada na Comissão de Administração e Serviço Público.
Os PLs 4392 e 757 apontam em suas justificativas não haver concorrência na prestação do serviço e que os prestadores impõem seus preços aos tomadores que são obrigados a utilizá-los. “Vislumbra-se na regulação econômica contribuição para desenvolvimento do transporte aquaviário e propõem que a Antaq assuma papel de regulador econômico. Esta proposição é defendida pela Marinha como autoridade marítima”, afirmou Salgueirinho.
A Marinha avaliou que o PL 1.565/2019, que tem objetivo de propor regulamentação e dar maior segurança jurídica à praticagem, está muito focado nas garantias de segurança do trabalho dos práticos e que existe pouca convergência entre textos apensados (4392/2020, 757/2022 e 1118/2023).
A autoridade marítima também vê o PL 877/2022, do Senado, com propostas que, em grande parte, visam adicionar à lei matérias de dispositivos infralegais já tipificados à exaustão na Normam-12, como a essencialidade e permanente disponibilidade do serviço, habilitação dos práticos em consonância com recomendações de organismos internacionais, emissão de certificado de isenção de práticos, escala de rodízio único, critérios para obrigatoriedade e isenção de praticagem, além de orientações sobre rumos e velocidades a serem emitidos aos comandantes nas zonas de praticagem (ZPs).
Para a autoridade marítima, a inserção de dispositivos infralegais já regulamentados na Normam-12 comprometeria a dinâmica da regulação técnica da atividade estabelecida na Lei de segurança do tráfego aquaviário — Lesta (9.537/1997). O PL 877/2022 menciona regulação econômica do serviço e a sua precificação em caso extraordinário de risco de interrupção do serviço ocasionalmente por ausência de acordo entre as partes. “São assuntos de natureza técnica, incompatíveis com uma legislação que se destina a ser perene e que trata de temas que tendem a evoluir rapidamente com a tecnologia disponível”, ressaltou.
O diretor de portos e costas explicou que a única menção sobre remuneração do serviço constante na Lesta, em seu decreto regulamentar, restringe-se à possibilidade de a autoridade marítima fixar preços temporariamente e precariamente para assegurar a disponibilidade do serviço nas ZPs estabelecidas. A DPC é responsável por regulamentar serviço da praticagem, estabelecer as ZPs onde é obrigatório a utilização do serviço e especificar as embarcações dispensadas do serviço.
Salgueirinho frisou que a autoridade marítima enxerga na implantação da regulação econômica a complementaridade que falta à regulação técnica exercida pela Marinha, de forma a amenizar o poder de mercado que o monopólio concede ao prestador de serviço (prático), enquanto a autoridade marítima demanda a sua contratação pelo tomador do serviço (armador). Ele disse que a diretoria revisou a Normam-12 há pouco mais de 2 meses, já incorporando orientações apontadas em recente auditoria operacional na atividade realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU).
O diretor disse ainda que, após a extinção da Comissão Nacional para Assuntos da Praticagem (CNAP) em 2019, o aperfeiçoamento permanece na pauta política dos governos desde 2012. “A despeito da inexistência de regulação econômica da praticagem brasileira, a Diretoria Geral de Navegação (DGN) e a DPC mantêm permanente diálogo técnico com armadores e práticos na preservação da apreciada qualidade do serviço”, garantiu.
Durante a audiência, o presidente da Federação Nacional dos Práticos (Fenapráticos), Gustavo Martins, disse que, há mais de 60 anos, o serviço passou a ser atividade privada e pautada na livre negociação de preços, o que permitiu crescimento da atividade, investimentos e formação de práticos e operadores de atalaia com alta qualificação, trazendo um serviço de primeiro mundo sem custos para o poder público. “Precisamos de segurança jurídica. Infelizmente, há alguns anos, houve tentativa de alterar os preceitos que regem o serviço através de decretos, sem atentar ao que dizia a Lesta. Se percebeu que o arranjo atual em que todas as principais regras são definidas pela Normam (12) não é suficiente para garantir a segurança jurídica do serviço”, comentou.
Martins considera que o PL 1565/2019 e o PLS 877/2022 foram editados com objetivo de trazer segurança jurídica com base nesses preceitos, os quais classifica como fundamentais para garantir qualidade e segurança do serviço para a lei, a despeito de uma tentativa de alterar por decreto. Ele julga necessário que o assunto seja discutido no Congresso. “Não se tenta mudar nada com projetos atuais. Nas alterações propostas em outros projetos, inclusive do governo, se deseja voltar no tempo, para que o governo atue mais diretamente em substituição à livre negociação”, acredita.
Martins acrescentou que a maioria das ZPs tem contratos negociados livremente com seus armadores. “Declarar que o preço do serviço de praticagem interfere no custo Brasil é uma falácia. A falta de serviço de praticagem de qualidade traria grandes prejuízos para economia e para geração de renda no Brasil”, manifestou em sua participação na audiência.
Fonte: Com informações do site portosenavios.com.br, matéria publicada 01 de setembro de 2023.